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CAMPO & CIDADE

Dona Francisca - Shopping Center a céu aberto

  • - Onévio Zabot - Engenheiro agrônomo e servidor de carreira da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina (Epagri) - Membro da Academia Joinvilense de Letras

Da redação - Onévio Zabot - 16/7/2022 - 22h09min

Mais um empreendimento às margens da rodovia SC 418, Distrito de Pirabeiraba. Empreendimento de origem familiar. Família Merkle, tradicional na região. Abriram um entreposto com produtos coloniais.

Produção própria: pães e biscoitos, e garapa da lavoura de cana-de-açúcar, ali, ao lado. Cana orgânica. Ambiente de negócio também para parceiros, empreendedores familiares, assim como eles.

Uma jovem procedente da estrada do Salto II, Vila Nova, aproveita para colocar à venda chips feitos partir da biomassa de banana verde. Henrique, Engenheiro de Alimentos, e a Dione, Engenheira Agrônoma, ambos da Epagri, como técnicos orientadores do projeto destacam a ousadia de Alexandre e sua esposa, os protagonistas. Ambiente caprichado, cumpre todas as normas da vigilância sanitária. Um primor.

Naquele exato momento veio-me à mente a diversidade de empreendedores estabelecidos ao longo da rodovia SC 418 - um verdadeiro shopping center a céu aberto. E também sobre a evolução desse oásis familiar ao longo dos tempos. Senão, vejamos:
Estrada da Serra Dona Francisca, Joinville. Estrada do Mate. Ou simplesmente Rodovia SC 418. Qual delas evocar?

A linha do tempo salta aos olhos.
Quando a região era mata virgem, despovoada, portanto, ou mais tarde, já discreta trilha de índios. Ou muito, muito antes quando em formação há milhões de anos atrás. Era quaternária. Fenômenos nada lisonjeiros moldaram o relevo, configurando-o: picos de serras, vertentes e canhadas, e mais abaixo a planície extensa a bordejar as águas sobranceiras da Baia da Babitonga.

E o verde, exuberante, então. Mata Atlântica desdobrando-se altaneira: mangues e restinga - berçário marinho -, floresta ombrófila densa, e mista mais adiante nas quebradas da Serra. E, por fim, decidual. Araucárias e erva mate, verde musgo cobrindo os espigões de esperança.

E mais: com os índios: o ciclo do pinhão e do marisco. Casqueiros imortalizaram os feitos do povo dos sambaquis; empilhados aqui e acolá no vasto território à sombra dos coqueirais. E há outras evocações: o sonho dos colonizadores de ultrapassar as montanhas azuis ao oeste, um senhor desafio. O Conselho Comunal - colegiado de governo da jovem colônia -, em 1852, invocava tal desafio.

Léonce Aubé inicia no mesmo ano a povoamento do vale do rio Cubatão. Vila Francesa, futura Pirabeiraba. Os topógrafos Carl August Wunderwald (Cavaleiro da Ordem da Rosa, título concedido por Pedro II) e Carl Pabst - munidos de instinto selvagem -, desvendam veredas: farejam a trilha dos índios. E margeando o rio Cubatão acessam ao rio Seco e dali galgam o topo da serra.

De uma incipiente picada em plena floresta projetam a nova estrada. Sua construção um feito e tanto. Conselheiro Pedreira, a pedido de Imperador Dom Pedro II - inspeciona obra. Fica eufórico com o que constata. O ano: 1859. Evento marcante para comemorar o feito é realizado. A data: 15 abril. Memorável, sempre evocada.

A localidade é elevada a Distrito - reivindicação do prefeito Plácido Olímpio de Oliveira -, decreto 439 de Aristiliano Ramos, então governador de Santa Catarina. No dia 31 de maio de 1865 um grupo de cavaleiros procedentes do planalto adentra triunfante em Joinville. Ato contínuo, no dia seguinte retornam com mercadorias compradas no estabelecimento de Jacob Richlin.

E, em 1877 a primeira viatura desce a serra. Depois vieram os carretões, muitos carretões subindo e descendo a Serra, consolidando assim o ciclo comercial, tendo o mate como carro-chefe. Locomotiva verde.
O historiador Apolinário Ternes na obra: História Econômica de Joinville (1986), é taxativo: "- E foi no mate, na estrada da Serra, no Porto de São Francisco do Sul, e no gênio inventivo, criador e ousado do elemento colonizador que estão fincadas as bases do desenvolvimento econômico de Joinville".

Evocar a estrada Dona Francisca - sua beleza natural e a cortesia de sua gente -, exige mais do que uma simples crônica. Exige sobretudo atenção, pois é rica e diversificada. Não apenas ao longo do trajeto, mas também nas adjacências. Estradinhas enrodilhadas, bico de mato. E são tantas, desde a estrada do Mildau até a estrada Laranjeiras. Esta no cume da serra. Paisagem incomparável. E o que dizer dos riachos então.
Borbulham choramingando de alegrias nos grotões.

E mansinhos podem ser colhidos nas conchas das mãos. Mas que, não se renegue a sua força quando o Thor - divindade do trovão - despeja água serra abaixo cobrindo de espumas os remansos. Nessas alturas, com alegria, resta-me evocar Roland Barthes. Instado a resumir em poucas palavras, o necessário para bem viver. Ousa.

Ora, afirmou categórico: - "Apenas um pouco de saber, um pouco de sabedoria e muito sabor. E precisa mais. Tudo isso tem de sobra certamente no Shopping Center Dona Francisca. E mais: para deleite dos visitantes, a céu aberto. Mundão de Pirabeiraba. Alvissarás à boa gente!


Joinville, 16 de julho de 2022

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